6.5.08

Maria Gabriela Llansol



26 de Junho de 1994



_______________________vi hoje o medo numa andorinha: prefiro vê-lo em mim própria. Uma andorinha parada, no canto angular da cozinha com o olho vidrado de impotência, não é aspecto da natureza desmunida que eu queira ver.
Mas vi.
E, no espírito do meu corpo, que estava na minha mão e no meu olhar, desenhou-se a figura do monstro da metanoite, aquático, viscoso,
que habita nos confins da terra,
e vem ter connosco
para se
salvar no humano,
se houver humanos que assim queiram. E, se houver,
haverá medo, linguagem, beleza e pensamento.
A triologia do belo, do pensamento e do vivo que esconde um medonho em si.
Esta cozinha, todas as janelas, pode precipitar em formas monstruosas, no meu espírito______________andorinhas

desprevenidas. Foi-me dado o dom, no entanto, de avançar para os monstros de mãos nuas. Disse-lhe, pegando nela com a repugnância já transformada em preensão:
Vai querida andorinha.
E, por um golpe do voo ou de magica que ocorre, sob o olhar ascendente, em todas as espécies, a andorinha retomou o seu corpo alado, volteou na imagem do Príncipe Feliz, de Óscar Wilde,
e levou consigo o medo profundo de perder a identidade
que se apoderara de mim
pela manhã.


De Inquérito às quatro Confidências -Diário III, Relógio D’Água, Novembro de 1996
Imagem: Jill Auville

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