12.8.09

José Antunes Ribeiro



Sentado na margem esquerda deste calmo rio contemplas
a floresta e o seu forte canto, é o vento é o vento em
tempo de vendaval a ondular a uivar, ouves o murmúrio
das águas revoltas tão próximas tão perto de nós,
fitas o vasto horizonte em busca da decifração
do mistério da vida e da morte. Que tem a floresta
a ver com todos estes pensamentos? Falavas tão
sabiamente do amor inundado de alfazema, alecrim, aves
nocturnas com seus presságios, as tuas mãos
cheias de carícias, a presença de um barco ancorado
no cais carregado de gente e nós prontos a embarcar
para portos distantes, não fora uma terrível dor
sob os meus ombros de feiticeiro vagabundo
em busca de um deus que não existe e está
irremediavelmente morto. Falavas, pois, de ventos uivantes
e florestas de castanheiros presos ao peso deste
outono inclemente e purificador. Peguei então
ternamente na tua mão e segredei-te: quem faz
perguntas, mente.


De Fragmento do Enigma, Colecção Imagem do Corpo – nº30, Ulmeiro, 1985
Imagem: Ben Goossens

Sem comentários: