21.12.10

Ana Luísa Amaral



Ah!os natais de infância
que não tenho em memória,
mas em nostalgia
- através das memórias dos
outros, das suas melodias: os
natais da minha infância.

Natais de infância - mas que neve?
Também eu sonho (e quem o não?)
um natal branco.
Queria neve no meu
natal de nostalgia. Queria
Fechar os olhos
E ver por dentro neve. Queria-
-me em país nórdico, ao menos
na nostalgia possível.
Mas o salto nos símbolos
de que é feita a vida:
uma falha de salto por degrau
ausente.

Ah! Um natal inocente de ternura
e figos, amigos e a mesa em
nostalgia, como as cores
do presépio.
Um natal inocente e
de perdão.
    [transler: a maldição de ser
    assim: sempre presente
    a outra culpa: direito a nostalgia
    de natal: (a morte, a fome,
    o frio): um privilégio]

Também não ter natal
nem em memoria. Só uma nostalgia
de doer.
Até a nostalgia
finalmente
começando a ceder:
nem país nórdico, nem a neve por dentro,
nem alegria a sério
na memória.

Como receita,
adicionada a culpa dos direitos,
associada a lucidez da
trans-leitura.

Hoje, na noite de Natal


ah! Os natais de infância
que nem em nostalgia
me cegam de ternura


Lisboa, 1956
retirado de Natal...Natais "Oito séculos de Poesia sobre o Natal - Antologia de Vasco da Graça Moura
Imagem: David E. LeVine

4 comentários:

comboio turbulento disse...

Este blogue cada vez está mais interessante, mais bonito, mais bem preenchido. É bom voltar. Bom Natal(seja o que isso for)

João Ricardo Lopes disse...

Sentimos todos falta da tua poesia, Margarida. Venha ela, venha mais, mais amiúde!

Nadir disse...

kim, mais vale tarde que nunca. Por onde andas? O teu combóio nunca mais saiu do apeadeiro ou, nunca mais chegou...(?)

Nadir disse...

João, contigo já falei mas, de qualquer forma, agradeço de coração a tua visita e o teu interesse neste cantinho.

Abraço amigo para ti

margarida